A liberdade de se expressar na rede: uma reflexão enquanto DeMolay
Umberto Eco, escritor e filósofo italiano, ao receber o título de doutor "honoris causa" em Comunicação e Cultura na Universidade de Turim, em 2015, declarou que "as redes sociais deram voz aos patetas"¹, já que conferiram a qualquer pessoa o mesmo direito à palavra de alguém premiado com o Nobel.
Na época, a crítica já havia sido contundente. Hoje em dia, sequer tem como ser refutada, especialmente em razão da conjuntura política-ideológica existente no Brasil e ao redor do planeta. Independentemente do que cada pessoa acredite ou defenda, bem como dos seus dogmas ou crenças, é fato posto que a internet deu voz a todos, até mesmo aos "patetas", e com paridade.
Assim como na realidade off-line, na internet prevalece como regra a liberdade de expressão, da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, ambas asseguradas pela Constituição da República². Isso significa que todas as pessoas são livres para se expressar como e quando quiserem. Apenas como exceção se opera o controle do que é falado – ou publicado –, o que normalmente é realizado pelo Estado ao atender pedidos de remoção de conteúdo, em consonância ao Marco Civil da Internet.³
A liberdade de se expressar, portanto, não é absoluta. A depender do que for compartilhado, a pessoa pode (a) ter o seu conteúdo removido, (b) ser responsabilizado, arcando com o pagamento de indenização pelos danos que causar, (c) responder criminalmente, em hipóteses de calúnia, injúria, difamação, racismo, entre outros delitos, ou, (d) tornar-se alvo de cancelamento ou outra "sanção social".4
Com efeito, embora o controle majoritário do que excede o limite da liberdade de expressão seja realizado pelo Poder Judiciário, caso qualquer usuário descumpra os Termos de Uso de plataformas, com o compartilhamento excessivo de fake news, por exemplo, estará sujeito a ter sua conta suspendida ou removida indeterminadamente, como houve com o ex-Presidente Trump (EUA) no Twitter, o que não pode ser interpretado como censura, já que a relação provedor-plataforma é regida por regras privadas.
Interessante, mas qual a relação do assunto com a Ordem DeMolay? É simples, a Ordem é extensão do mundo profano, de modo que as regras aplicadas fora do templo, devem ser seguidas nas relações dentro do templo. Assim, todo DeMolay é livre para expor sua opinião, lutar pelo que acredita e defender seus ideais, mas sempre pautado nas diretrizes e ensinamentos que a Ordem propaga, consciente de que sua voz tem peso, inclusive para legislação pátria.
Por essa razão, compartilhamento de pautas que instiguem o ódio, caracterizem crimes ou afrontem princípios consagrados, não devem ser feitos por DeMolays – e por certo não são. Embora a afirmação de Eco tenha sido acertada, no contexto da Ordem não existe nenhum "pateta", pelo contrário, vê-se meninos e homens íntegros e comprometidos com a causa.
De todo modo, o artigo serve para que cada membro, não importando a idade, conheça como a lei profana regula a liberdade de expressão e quais são os seus limites, bem como para que pense, duas vezes se possível, em seus discursos na rede, ponderando sobre o que, como e qual a extensão do que é compartilhado.
Eduardo Helaehil é advogado e sênior DeMolay.
¹ "Patetas" não foi a palavra original usada por Eco em seu discurso, mas o sinônimo é mais adequado para o artigo.
² Artigo 5, IV e IX da Constituição da República de 1988.
³ O Marco Civil da Internet é a Lei n° 12.965/2014, responsável por regular a internet no Brasil.
4 É necessário lembrar que, segundo Lawrence Lessig, professor da Harvard Law School e autor do livro "Code and Other Laws of Cyberspace" (1999), as normas sociais igualmente moldam condutas. Há quem tenha mais medo do cancelamento do que de medidas criminais.